terça-feira, 2 de novembro de 2010

Em Nome do Vício - Parte 1

A minha volta a Polônia foi tranqüila. Sem transtorno na viagem, sem “russo” sem cerveja, tudo como manda o figurino. Priceless Girl buscou-me pela manhã na estação de trem e fomos para casa dela onde eu ficaria. Coloquei minha tranqueira toda no guarda-roupa, e ficamos conversando para colocar as novidades em dia.

Era estranha a situação, pois parecia que eu havia invadido a vida dela. Como o cara chega assim do nada, toma parte do guarda-roupa e diz que vai ficar até março? Eu era muito cara de pau. Eu não sabia qual seria meu destino após a Polônia, só sei que eu teria que voltar a Praga para embarcar de volta para o Brasil.

Os primeiros dias passavam e a coisa continuava a mesma. Pela manhã ela acordava e ia para o trabalho enquanto eu ficava em casa assistindo TV ou no computador fuçando a internet. Eu não podia sair de casa, porque caso saísse e batesse a porta eu teria que ficar na rua até que ela voltasse, o que poderia demorar um bocado. Priceless Girl tinha um emprego normal em uma companhia finlandesa, e a noite tinha atividades como instrutora de aeróbica em algumas academias. Portanto, ela poderia chegar até mesmo às 10 da noite. Era melhor não sair.

Após dois dias resolvi armar o Xbox e jogar um pouco. Era segunda-feira e não tinha nada para fazer. Ligar a TV e não entender nada do que se falavam não era legal. Era só blábláblá. Tirei o material vicioso da mochila e fui armando-o na sala. A TV que ela tinha era um “pouco” antiga, mas estaria tudo numa boa desde que funcionasse. Como não era esses modelos LCD, LED ou Plasma de hoje em dia sabia que o cabo HDMI não serviria de nada. Foi então que peguei o cabo para colocar na entrada AV. Virei a TV de lado e pimba! Não tinha AV. ¬¬

Era aquela entrada antiga que só se via na Europa. Eu precisava de um adaptador. Na caixa do aparelho sabia que encontraria, mas como levei na mochila, acabei deixando algumas coisas na casa dos Hakkinen, e o adaptador tinha ficado lá junto com a caixa com instruções e tudo mais. Não tinha outra opção, era sair para comprar o tal adaptador. Eu não quis arriscar ficar fora de casa até sabe-se lá que horas. Esperei para contar a minha decepção a Priceless Girl à noite.

Ao chegar em casa tive uma ótima notícia. Ela trazia consigo chaves para mim. Tinha pegado com sua mãe as chaves extras e deixaria comigo para que eu não ficasse preso em casa como um detento em condicional com aqueles rastreadores na perna. Fiquei feliz com a notícia e contei a ela sobre o problema com a TV.

- Você pode ir a uma loja em Manufaktura. Eles têm quase tudo de eletrônicos lá, certamente irá encontrar o que deseja. – disse ela.

Então era isso, durante a manhã eu iria ao centro tentar achar esse tal adaptador. Como estaria sozinho, seria o primeiro desafio lingüístico que teria na cidade de Łódź, e lembrando que tive uma péssima experiência em Katowice, sabia que aquilo não seria nada fácil.

Na manhã seguinte, após a minha namorada sair para o trabalho, resolvi me preparar psicologicamente para ir encarar meu desafio. Eu sabia mais ou menos o caminho a pé para o local. Não tinha o excelente mapa do McDonald’s comigo, teria que me virar. Vesti-me, fiz o sinal da cruz e sai de casa.

Estava frio lá fora, era neve acumulada em todo canto, gelo nas calçadas e um vento que parecia rasgar a pele. Nada disso importava, eu era guerreiro, precisava da droga do adaptador e não iria desistir por causa de um “friozinho bobo”. Saí do bloco onde estava e segui pela rua principal. Eu não tinha calçados para aquele tipo de ambiente. Usava um tênis baixo e marrom, que usara em Salvador para ir à faculdade. Então você imagina a situação, eu tentando andar e a neve que se acumulava e já batia quase no tornozelo, não deixando. Seria um árduo trajeto até o centro.

Andei pela rua principal e cheguei a um cruzamento.

- Hmm, acho que devo seguir adiante. Se não me engano a frente acharei uma pequena passarela que corta trilhos do trem.

Coisa linda é que na Europa você aproxima-se da faixa de segurança e os motoristas param. Param? Sim, eles param, mas não na Polônia. É raro um sacana parar para que você passe. E eu fiquei um bom tempo no cruzamento esperando um filho de Deus parar para que eu pudesse atravessar. E adivinha... Ninguém parou. 
O jeito era meter a cara e rezar para eles ao menos diminuírem a velocidade naquele asfalto escorregadio. Arrisquei-me e deu certo, quando eu estava no meio da faixa vi carros diminuindo a velocidade e parando enquanto eu estava na faixa.

- Hmm, então é assim que funciona aqui.

Saí andando numa boa e continuei seguindo a rua. Andar naquela neve parecia como na arei de praia, acho que por isso esse povo polaco desenvolveu pernas tão fortes. Três meses andando em toda aquela neve não teria como haver outro resultado. Seguia pela calçada, e logo vi a passarela. Subi as escadas e atravessei-a. Cheguei a uma avenida e precisava atravessar. Esperei que o sinal fechasse e atravessei-a. Deveria seguir em frente? Eu não lembrava direito, mas o senso de direção dizia que deveria. Eu saberia que estaria perto quando visse uma bicicleta pintada de branco que pertencia a um rapaz que havia morrido atropelado ali.

Eu continuava a me “arrastar” pela neve tentando ver a tal bicicleta branca. Avistei-a de longe e então percebi que não estava perdido. Estava chegando perto dela quando algo um tanto quanto inusitado ocorreu. Uma pessoa estava tirando a neve da varanda do apartamento e eu não tinha percebido. Ao passar perto recebi uma rajada de gelo na cabeça. Maldição. Acho que eram cerca de 6kg na minha cabeça. Não deu nem tempo de reclamar com o sacana que jogou aquilo em mim, quando olhei para cima não vi mais ninguém. O jeito era limpar-me e continuar o percurso.

Após a bicicleta havia um muro gigante e um clima um tanto quanto sinistro. Acredite, a cidade é bem esquisita quando se vê pela primeira vez e no inverno parecia uma cidade fantasma. O muro pertencia a um cemitério e eu odeio cemitérios. Tudo que mais queria era sair daquela área. O muro parecia não ter fim. Andava o mais rápido possível para passar por aquilo e enfim vi um semáforo adiante. Era o ponto de chegada.

Atravessei o sinal e um estacionamento que vinha logo à frente. Estava num shopping chamado Manufaktura. O que restava era apenas achar a tal loja que Priceless Girl havia indicado.

BR Na Europa!

3 comentários:

  1. "Eu saberia que estaria perto quando visse uma bicicleta pintada de branco que pertencia a um rapaz que havia morrido atropelado ali."
    Que tipo de ponto de referência é esse?! Me explique isso direito.

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  2. @Samuca a bicicleta era do defunto... ficou lah amarrada na arvore e como eu já tinha passado no local, sabia que quando visse estaria no caminho certo e perto do meu destino

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  3. Oi, te mandei um e-mail hoje. Vc ainda esta em Łódź ??? Brenno Rosa

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